Filho de peixe, peixinho é. A máxima é batida, mas cabe sob medida para o chef Ricardo Lapeyre, que desde pequeno acompanhou o pai Claude Lapeyre na cozinha (tem uma foto dele pequeno, dentro de um panelão), chef francês que veio para o Rio na mesma leva do Claude Troisgros. Inevitável não lembrar.
Mas, apesar de ter começado cedo a trabalhar, de ter passado por bons restaurantes da cidade, só agora, uma década depois, Ricardo finalmente tem o seu próprio espaço. É o Escama, uma das melhores novidades desse verão.
Funcionando numa casa espaçosa da Rua Carandaí, por onde já passou do francês Allons Enfants ao espanhol Venga, a novidade é certeira.
"Fiz tudo com muito carinho, tudo pensado e planejado como durante anos imaginei", me disse Lapeyre, que tem levantado de madrugada para acompanhar de perto a pesca de piraúna, prejereba, sargo, xaréu, peixes bissextos, que nas suas mãos viram crudos fresquissimos ou são dourados no braseiro.
São dois andares e muitos "nichos" gostosos ao ar livre com mesas espaçadas. Alguns tampos de mesas trazem o antigo piso do térreo, que precisou ser substituído.
Embaixo, fica a parte fria, o oyster bar; em cima, a cozinha quente, aberta, voltada para o salão que ganhou uma claraboia. Tudo é leve, alegre e simples.
O cardápio é descomplicado e segue a maré do dia. No couvert, latinhas do tipo usadas para conservas, chegam recheadas de lentilha puy com mexilhões; cubinhos de peixe branco no leite de coco ("essa receita aprendi com o meu mestre Roland Villard"), rillete de badejo deliciosa, os tomatinhos temperados e três manteigas aromatizadas moldadas em conchas ("usei as forminhas de madeleines" ). E pão sourdough quente, de casquinha crocante, da turma do Araucária.
O carpaccio de vieiras canadenses ("a nossa é muito pequena, a temperatura do mar não ajuda") é salpicado com pipoca de quinoa e salicornio, conhecido com aspargos do mar, que o chef descobriu em Mangaratiba.
A tarte tatin é a opção para veganos, de cogumelos Paris e queijo vegano. O gravlax é de namorado ("cortei o salmão, temos peixes maravilhosos") com hibiscos e creme azedo.
Na parte quente, lagostins grelhadas, lula idem, servida com gremolata (salsinha, alho e limão) e pimenta biquinho, moules frites...
Na carta de vinhos feita pela sommelière Elaine Oliveira, rótulos interessantes, frescos e de cifras generosas.
"No Escama tudo é fresco e com muita história por trás. A Elaine, por exemplo, é minha amiga de anos, parceira de muitas taças. Na cozinha, tenho profissionais que foram meus colegas de colégio. E aproveitei muita gente do Laguiole, que fechou, que trabalhavam comigo... É uma casa nova, mas ninguém aqui é novato".